Esporte Lírico |
- O Salto -
O salto é esperado e o tempo será? Do alto observo o
entardecer róseo dourado impregnar desde as mais finas nuvens do céu até os
desvãos e os recortes da rica e suntuosa arquitetura. Pés unidos sob uma tensão
passiva, respiro... A ansiedade cristaliza esse instante, a ampulheta trabalhou
no tempo certo, a pressa fez-se desnecessária e disponibilizou-me a eternidade.
Aprendi naquele momento a aceitar o ritmo da existência e dos acontecimentos
por eles mesmos. O desejo pode criar uma distancia enorme entre você e o real...
Fecho os olhos, deixo a respiração seguir seu próprio ritmo e integrar-se ao
todo... Tudo acontece quando é necessário, quando o discípulo está pronto o
mestre aparece, o seu valor, o seu vazio, a sua receptividade, tornam isso
possível. A impulsividade, a atitude agressiva e a pressa limitam.
Sinto o corpo ereto, alinhado, ser tomado por um movimento
oscilante, involuntário, rítmico. Traído pelo pensamento, tomado por uma
atitude impulsiva, a respiração escapa e o medo instala-se. Uma vez o tempo
perdido ele ficará perdido para sempre por isso tenha pressa, salte! Os músculos contraem-se, meu coração bate mais forte e mais
rápido, as artérias dilatam-se, a temperatura corporal aumenta, a respiração
torna-se curta e rápida.
Os olhos anseiam ver, é impossível mantê-los fechados, observo tudo... Vejo as pessoas correndo de um canto para o outro elas parecem nunca gozar lugar algum, correm ao redor do mundo, de um hotel Intercontinental para outro hotel Intercontinental, estejam eles em Tóquio, em Mumbai,em Nova Iorque , ou em Paris. Esses hotéis
Intercontinental são todos iguais... Observo aversivo e hipnotizado... E as
pessoas continuam correndo de um para o outro pensando estarem viajando através
do mundo.
Os olhos anseiam ver, é impossível mantê-los fechados, observo tudo... Vejo as pessoas correndo de um canto para o outro elas parecem nunca gozar lugar algum, correm ao redor do mundo, de um hotel Intercontinental para outro hotel Intercontinental, estejam eles em Tóquio, em Mumbai,
Respiro...
Elas poderiam ficar em um único hotel da rede sem a
necessidade de ir a nenhum outro, mas a ansiedade e a rapidez estão tornando as
pessoas neuróticas. Reencontro o meu instante.
Retomo o controle, cabeça para cima e face para frente... O
corpo tenso aos poucos descola e escapa ao solo, as extremidades tremulas
lembram-me do contato, a brisa corrente amaina a alma, a forte contração do
diafragma eleva minhas costelas expandindo meu peito e fazem-me retornar ao
tempo... Uma respiração ainda mais profunda proporciona-me conforto e confiança,
fecho os olhos, viro-me e dou um passo, e outro e outros... No meu tempo.
Marcio Marega
- Como se
Quisessse Falar -
Como se quisesse falar o coração para. A
ansiedade cristaliza o momento e me entrega a eternidade, os olhos anseiam
ver, porém a alma é tomada pela escuridão, sinto meu corpo envolto pelo véu
do deus rio formando agora o único limite perceptível entre o mundo e o
além... foi-se a
hora e não sei se ainda há vida, foi-se o ultimo fino gesto
e sou devorado pela astucia traiçoeira do tempo que ansiei.
Tomado por um
impulso fugaz quase involuntário abro os olhos, a imensidão azul emoldurada
por enormes estruturas de metal branco servem agora como pano de fundo e
suporte para o meu único foco, a imperativa ampulheta no alto da parede
contrária.Não sei quanto tempo isso durou, talvez
apenas o suficiente para eu
constatar, de forma cruel, o toque incerto e o tempo passado.
Escapam-me
as lágrimas, talvez a fim de proteger um olharque não é mais meu,
a
frustração estampa nos olhos o desespero e vejo as coisas acontecerem
enquanto
não sei onde estou, procuro refugio na escuridão da batalha que não
venci,
lentamente, sem forças, deixo a cabeça tombar à frente e percebo que o
esforço
não foi suficiente. Sinto a minha energia escapar nesse momento ainda
mais concentrada
quiçá por todos os meus pensamentos, aflições, angústias e
um verdadeiro e oceânico
desejo de vitoria, agora sublimado por um piscar
de olhos eterno.
- Um Erro -
Engoliu o café preto sem açúcar
mesmo, já que ainda não tinham terminado de desembalar todas as coisas. Fez uma
careta quando o amargo tocou a garganta, e amassou o copinho. Mexeu os dedos
dos pés dentro das botas, evitando as câimbras que sempre chegavam nos piores
momentos de ansiedade (era quase um tique nervoso, uma simpatia, como se tudo
fosse dar errado não fosse esse gesto). O sol brilhava, e o céu era
azul-quase-roxo, quase hipnotizava. Ficou um tempo parado, olhando lá fora, mas
o calor já começava a grudar a camiseta branca no corpo, então resolveu voltar.
Os braços do macacão estavam amarrados na cintura, quando começou o burburinho.
O estômago revirou o café, e as mãos tremiam um pouco enquanto terminava de se
vestir, e colocava a balaclava, já sentado naquele banco que era sempre
perfeito para o seu corpo. Era como se aquele fosse o seu lugar, a sua evolução
natural, e parecia até irônico que não se sentisse seguro andando em duas
pernas por aí. Calçou as luvas, e alguém que ele nunca sabe quem, em nenhuma
das inúmeras vezes, ajudou-o com o capacete. Virou levemente o pescoço para os
dois lados, estalou os dedos, e segurou o volante com as duas mãos
firmes, esperando.
Pisou de
leve no acelerador, e abriu seu tradicional sorriso de olhos fechados quando
ouviu o ronronar do motor. Seus dedos acomodaram-se nas curvas da direção, e
sua respiração, antes rápida e entrecortada, agora era lenta e calma. Abriu os
olhos e acelerou. Pensava e o carro reagia, como se seu corpo e o carro fossem
agora um só. Fez a primeira curva, entrou na segunda, e ainda acelerava quando
entrou na reta oposta. Foi aí que tudo aconteceu. Em um momento seu pé pisava
fundo no acelerador, esquecendo-se da curva que vinha logo em seguida, e no
seguinte, tudo rodava. Abre os olhos, mas não consegue dizer qual o seu estado.
Muito menos o do carro. Sabe que ele foi arremessado contra o muro, e ouve
sirenes que parecem estar mais longe do que a verdade. Uma lágrima escorre pelo
seu rosto, manchando a poeira e o sangue vermelho. "Um erro. Um erro. E
nada mais me importa", ele pensa.
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Moraes Simi Petrini
Sempre bom ler bons textos, Márcio.
ResponderExcluirParabéns!